terça-feira, 21 de setembro de 2010

Um severo ajuste fiscal

Fui um eleitor fiel de Luís Inácio Lula da Silva e do PT até 2002, quando, após três eleições perdidas pelo atual presidente,  vi-o ser eleito para - segundo acreditava - iniciar a transformação de um país marcado pela concentração da renda e da riqueza nas mãos de uma elite econômica, mas deixei de fazê-lo no momento em que percebi que o governo do ex-operário sofrido, vindo de Pernambuco, decepcionaria parte de seus eleitores - um pequeno grupo, é verdade, do qual faço parte, mas que lhe fora fiel durante longos anos -, principalmente os que almejavam um governo, no mínimo, de forte orientação social-democrata de vertente trabalhista e socialista,  ao deslocar-se para o centro, chegando a ciscar para a centro-direita em algumas ocasiões.
 
Contudo, ao assistir à entrevista dada pela candidata pelo PT à Presidência da República, Dilma Roussef, a William Wack e Cristiane Pelajo, fiquei indignado ao constatar (mais uma vez) a agressividade de jornalistas e tecnocratas no trato a candidatos que não compartilham com o seu - e das empresas para as quais trabalham - ideário, eivado de forte desejo por "um severo ajuste fiscal", o qual a candidata acertadamente rejeitou - não sei se apenas em termos retóricos, ou como uma convicção ideológica - como sendo, se praticado no Brasil atual, "um crime".

A maldita linguagem econômica e o fato de existirem milhões de brasileiros sem um mínimo de formação educacional, cultural, política e ideológica impedem que estes mesmos milhões, muitos dos quais eleitores ou influenciadores de eleitores, tenham consciência do que pode significar para suas vidas e dignidade - e de seus entes queridos -, um aumento dos investimentos do Estado em infraestrutura (estradas, portos, aeroportos, ferrovias, hidrovias, e outros) em termos percentuais com relação ao PIB, e com recursos retirados (frise-se) dos chamados gastos correntes, bem como por meio de uma diminuição da carga tributária através de cortes em benefícios previdenciários (aposentadorias, pensões e licenças médicas por motivo de saúde, por exemplo), assistenciais (LOAS e Bolsa Família, por exemplo)  e no arrocho dos salários ou na demissão de funcionários públicos - estatutários ou vinculados à CLT -, e é exatamente esse conjunto de medidas perversas que o termo "severo ajuste fiscal", mencionado por William Waack, pode ser traduzido para uma linguagem mais inteligível.

A assistência a jornais televisivos e a leitura de certas revistas semanais nos mostra que a elite econômica deste País, associada a uma classe média profundamente individualista, persistem e persistirão em suas ações de bombardeamento da chamada opinião pública com o fito de convencê-la e atraí-la para seus objetivos, e também em outras ações não acessíveis a grande e esmagadora maioria dos brasileiros, a fim de atingir seus anseios ideológicos, caracterizados pela minimização do Estado nas áreas de previdência, assistência social e gastos com o funcionalismo, entre outros, e - embora não admitam - maximização do referido ente (o Estado) no forte apoio ao capital, seja ele "nacional" ou transnacional .


Quem quiser assistir à entrevista na íntegra, acesse o link abaixo:



terça-feira, 7 de setembro de 2010

Desindustrialização após 1992

Apesar de minhas reservas com relação ao economista Luiz Carlos Bresser-Pereira, especialmente por sua atuação no governo de Fernando Henrique Cardoso,  no qual contribuiu com propostas de reformas neoliberais estando à frente do Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado, concordo com parte do que li em seu artigo, intitulado "Brasil vive desindustrialização", para o qual coloquei um link no final de meu texto.

No artigo em questão, Bresser-Pereira sustenta, entre outras teses, que "O Brasil está se desindustrializando desde 1992", após "acordo com o FMI" , feito em dezembro do ano anterior, no qual constavam exigências de desregulamentação financeira para a entrada de "investimentos" (aspas minhas para contestar o termo) estrangeiros no País, diminuição significativa das tarifas de importação e extinção de diversos impedimentos  não-tarifários para a entrada de produtos estrangeiros na economia nacional.

Em consequência, "a moeda nacional se apreciou, as oportunidades de investimentos lucrativos voltados para a exportação diminuíram, a poupança (interna) caiu, o mercado interno foi inundado por bens importados, e, assim, muitas empresas nacionais eficientes deixaram de crescer ou mesmo quebraram. Estava desencadeada a desindustrialização prematura da economia brasileira".


É surpreendente ler os trechos seguintes escritos por quem apoiou, segundo minha memória que não creio ainda estar falha, os dois governos de Fernando Henrique Cardoso, e somente de uns tempos para cá parece ter se afirmado como um nacional-desenvolvimentista: "Se a desindustrialização é evidente, por que economistas brasileiros insistem em procurar argumentos para negá-la?" Em outro parágrafo, ele mesmo responde: "Porque são ortodoxos, porque pensam de acordo com o Consenso de Washington, e, por isso, apoiam a política macroeconômica instaurada em 1992".

Nesta altura de seu texto, muito provavelmente para não ser enquadrado como um "populista" - termo de significado controverso, quase sempre injustamente atribuído ao pensamento de esquerda brasileiro -, afirma-se um adepto da "responsabilidade fiscal", o que, trocando em miúdos, significa - e este é um dos pontos de seu pensamento com o qual não concordo em alguns de seus aspectos, pois sei o que essa pretensa moderação significa - não compactuar com propostas de distribuição de renda que passem ao largo de uma economia de mercado - apesar de que, no caso de Bresser-Pereira, com algum grau de regulação -, de um crescimento econômico dito sustentável e de gastos com previdência, assistência social e funcionalismo público subordinados a uma real capacidade do Estado para tal, balizadas, por exemplo, por um certo percentual máximo de carga tributária incidente sobre o PIB a ser tolerado pela "sociedade" - na verdade, pela elite econômica.

Por fim, o referido pensador de centro refere-se a necessidade de uma tal poupança interna, que tenderia a desvincular o País da necessidade de poupança externa, formada muita vez por capitais especulativos vindos do exterior. E neste ponto localizo uma possível brecha para a soltura do espírito animal do capitalismo selvagem, manifesto no mundo real através de um Estado dirigido pela elite econômica e fortemente tentado a buscar essa economia e consequente fortalecimento da indústria nacional em cortes de benefícios previdenciários, assistenciais e no salário - ou pior ainda - ou emprego dos funcionários públicos não pertencentes a carreiras ditas essenciais do Estado.






Para quem quiser ler o texto de Luiz Carlos Bresser-Pereira na íntegra, acesse o link abaixo

Um outro texto de Paulo Kliass sobre o mesmo tema