sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Alexis Tsipras e a destruição da Grécia

É muito decepcionante e triste que a maioria das pessoas pobres e de classe média gregas tenha que experimentar o sofrimento que estão experimentando, guiada por governos favoráveis à elite econômica nacional e transnacional e à ideologia da transformação do ser humano em lixo ambulante não-reciclável para somente a partir do aumento da miséria e da pobreza, impostos pela União Europeia, Banco Central Europeu e FMI, ir às ruas manifestar sua revolta e indignação, e passar a votar em um partido verdadeiramente (pelo menos até o momento) socialista e de esquerda, tal como parece ser o caso do Syriza.
 
Mais decepcionante ainda é imaginar que entre as duas classes mencionadas haja pessoas que escolheram os representantes do partido Nova Democracia mesmo tendo conhecimento de que estes pretendem seguir a cartilha exigida pelas três instituições mencionadas e por sua própria elite econômica.
 
Convém esclarecer que o adjetivo “socialista” mencionado não se relaciona com o que vem sendo usado pelo partido que usa esse adjetivo na própria Grécia mas não passa de um partido traidor do que se conhece por socialismo. Aliás, tal como já foi escrito em outro artigo neste blogue, o próprio adjetivo socialdemocrata é inaceitável para partidos que o adotam e seu nome e tenham se rendido e às teses próprias do capitalismo neoliberal em seu próprio país e em outros países do próprio continente e do mundo.
 
Também é útil alertar que muitos ventríloquos ou sapientes arrogantes e calculistas reacionários tenderão a justificar a tragédia que se está impondo a maioria dos gregos por meio da tese da chamada “destruição criativa”, de Schumpeter, disseminando a expectativa de que tais sacrifícios são essenciais para a construção de um futuro melhor para as próximas gerações gregas. Ingênuos e resignados, mas também sapientes reacionários da pior espécie tenderão a crer em tal tese sem ter consciência, no caso dos primeiros, ou com plena consciência, no caso dos segundos, de que tal caminho levará a maior parte dos gregos à miséria e a pobreza, e apenas uma elite econômica nacional e transnacional continuará intocável e cada vez mais rica.

Abaixo, entre aspas e em itálico, alguns trechos da entrevista de Alexis Tsipras.

A Grécia se converteu em um experimento ultra-liberal, em um porquinho da índia. Aqui se colocou à prova a política do choque para logo em seguida ampliá-la para o resto da Europa. Mas temos a reação da sociedade. As pessoas já não têm a vida cotidiana que tinham antes e são essas mesmas pessoas que reagiram para que as coisas mudassem. Com sua mobilização a sociedade ameaçou as elites de nosso país. Isso significa que estamos mudando a correlação de forças mediante o comportamento crítico das massas”.

A política de choque liberal implementada na Argentina nos anos 90 sob as ordens do FMI também foi aplicada aqui. Estamos neste processo, lento mas destrutivo, um processo que se comporta de forma muito violenta contra os povos e os marginalizados: planos de ajuste, ataque contra os salários, desemprego”.

... há algo que deve ser dito claramente: o neonazismo e a Aurora Dourada não são uma força anti-sistema. Não, trata-se de uma força do sistema dentro do sistema. É o braço mais forte do sistema que será utilizado se ele se sentir em perigo. O único perigo para nosso país são as políticas neoliberais, a troika (FMI, Banco Central Europeu e União Europeia) e o movimento neonazista, que é um aliado deles para seguir neste caminho”.

Na Grécia, o partido que representa a social democracia, o PASOK, não se diferencia em nada da direita. É uma cópia. Por isso nossa esquerda pode se converter em um polo de alianças com autêntica base social e popular”.

 
Leiam, por favor, na íntegra e com atenção e reflexão o muito bom texto de Eduardo Febbro, bem como a entrevista de Alexis Tsipras, líder do partido de esquerda grego Syriza, intitulado “Elites europeias estão causando retrocesso de décadas”. Quem preferir encontrar o texto usando algum sistema de busca, faça-o com usando as palavras-chave contidas no link abaixo seguidas de Eduardo Febbro e Carta Maior.

 
Elites europeias estão causando retrocesso de décadas
 

domingo, 9 de setembro de 2012

Auschwitz sem cercas

Estão livres, mas, ao mesmo tempo, estão aprisionados.
 
Estão livres, mas não para se alimentarem digna e adequamente quando estiverem com fome.
 
Estão livres, mas correm risco eminente de constarem entre as vítimas de todo tipo de violência, e de serem assassinados, pois não possuem a moeda dos incluídos para comprar, financiar ou alugar uma habitação digna na qual se sintam (e estejam de fato) protegidos.
 
Estão livres, mas não são nem serão atendidos por médicos muito bons em igualmente muito bons hospitais, pois estes são privilégios dos incluídos no sistema que exclui aos montes, e no mundo real nega o direito à vida à maioria dos que não conseguem pagar por uma assistência médica digna igual à oferecida aos mais ricos.
 
Estão livres, mas somente terão água tratada para beber e hieginizarem a si mesmos e suas residências se puderem pagar por esse serviço, e também pelo de coleta de esgotos, ambos privatizados sob o sistema neoliberal (capitalista selvagem). Se não puderem, estarão aprisionados em sua própria condição sub-humana, e serão como moradores de rua entre algumas paredes e uma cobertura.
 
Estão livres, mas não terão educação na quantidade e qualidade necessárias para uma melhor compreensão do mundo, nem para que esta os transforme em "capital humano", pois esta condição continuará sendo privilégio de poucos sob o sistema cujas características mais marcantes são a marginalização e a inutilização da maioria.
 
Estão livres, mas não para viver, pois para viver é necessário pagar, e para pagar é necessário ter renda, e para ter renda é necessário estar incluído, e para estar incluído é necessário ser parte da elite econômica, e para fazer parte desta é necessário estar e/ou ter potencialidade para estar empreendedor, cliente de alto poder aquisitivo, funcionário altamente especializado, artista ou atleta ímpar, ou ainda, capital humano dotado de qualidades ímpares para o sistema do capital.
 
Vêm a minha imaginação os rostos arrasados e os corpos esquálidos de judeus, ciganos, comunistas, socialistas, deficientes mentais, homossexuais e tantos outros, encarcerados e assassinados nos campos de extermínio nazistas, e brotam simultaneamente os rostos dos miseráveis das mais diversas cidades brasileiras (entre os quais constam os moradores e moradoras de rua), tratados com indiferença e desprezo pela maioria das pessoas que espelham o sistema neoliberal.

Esses miseráveis estão livres, mas, ao mesmo tempo, estão aprisionados.
 
Pois não há liberdade em um sistema onde os seres humanos não são livres para suprir-se do necessário para sua própria subsistência e dignidade.