sábado, 17 de janeiro de 2009

O real significado do "impostômetro"

Há um painel eletrônico no centro da cidade de São Paulo com diversas casas e números mutantes, o qual exibe uma estimativa do quanto os diversos governos (federal, estaduais e municipais) arrecadaram com a cobrança de impostos até aquele momento, e cujo principal objetivo (assim o dizem) é instigar os contribuintes a exigir do Estado serviços de melhor qualidade com menor cobrança de tributos. Chamam este painel de "impostômetro".

Por que não se coloca, ao lado do mencionado painel, um outro no qual conste o quanto desse total retornou, em termos percentuais, aos membros da elite econômica nacional e transnacional? E por que não se coloca, ao lado deste, um outro com uma estimativa dos percentuais de renda e de riqueza nacionais concentrados nas mãos dessa mesma elite enraivecida contra a carga tributária brasileira? Com estes dois últimos painéis, quem os compreendesse certamente concluiria que a injustiça tributária brasileira consiste na maior tributação (em termos percentuais) dos mais pobres, e não dos tributos cobrados dos mais ricos.

O primeiro painel mencionado (o do impostômetro), com seus números que mudam como os de máquinas caça-níqueis, pouco diz aos mais pobres e marginalizados deste País; ou ainda (e o mais provável): serve apenas como instrumento de manipulação dos mais pobres pelos mais ricos com o intuito de direcionar as frustrações dos primeiros contra o Estado. Mas contra qual Estado? Contra o Estado que remunera os títulos da dívida pública em poder dos segundos citados com uma das taxas de juros mais altas do mundo? Contra o Estado que se coloca à disposição dos abastados para emprestar-lhes dinheiro (através do BNDES e outros bancos públicos) a juros subsidiados? Contra o Estado que deve investir fortemente (ainda de acordo com os endinheirados citados) em obras de infraestrutura contratando, para isso, as mesmas grandes empresas construtoras das quais os mesmos endinheirados são acionistas para que essa mesma infraestrutura seja privatizada e tenha suas tarifas reajustadas ao bel-prazer destes últimos?

Não, não é contra este Estado que a elite econômica quer que os mais pobres se indignem. É contra o Estado que possui uma previdência pública regida por sistema de partição, e que contribui, apesar de algumas injustiças em seu interior (o chamado fator previdenciário, só para citar um exemplo), para que milhões de aposentados e pensionistas recebam os seus proventos após longos anos de contribuição ao sistema. A este sistema de previdência a elite focada quer obstinadamente privatizar, transformando-a em um sistema de capitalização.

Ainda não sendo suficiente privatizar ou reformar o sistema de previdência referido, a elite em questão se posiciona raivosa e indignadamente contra o setor do Estado representado pelos funcionários públicos, principalmente contra os que exercem cargos públicos de nível fundamental, médio e parte dos de nível superior e que não se enquadram nas chamadas "carreiras típicas de Estado" - as carreiras das forças armadas, assim como as de juiz, promotor público, auditor fiscal, delegado da Polícia Federal e delegados em geral, diplomata, e outros. É essencialmente contra o primeiro grupo de funcionários públicos mencionados que a elite em foco se enraivece quando seus salários são reajustados, e igualmente quando são publicados editais de concursos públicos, pois defende sub-repticiamente - às vezes o fazem publicamente, apesar dos riscos de diminuição do eleitorado de seus partidos de preferência, como o PSDB, Democratas (ex-PFL), PTB, PMDB e muitos outros pelos que conseguirem associar que são os que a representam - que sejam demitidos e substituídos por funcionários terceirizados, tal qual aconteceu com grande parte dos funcionários das ex-empresas estatais de serviços essenciais e/ou estratégicas privatizados.

Por fim, mas ainda não enquadrando todos os setores que a elite econômica quer reduzir dramaticamente ou simplesmente extinguir, é também contra o Estado que paga um salário mínimo a idosos (a partir dos 60 anos) e deficientes muito pobres, e igualmente os direcionados ao Bolsa-Família, que a elite econômica brasileira e transnacional quer se voltar, não obstante ser o Brasil um dos países mais destacados no quesito concentração da renda e da riqueza.

Utilizando-se de poderosos veículos de comunicação (Rede Globo, revista Veja, Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo e similares), e de instrumentos maniqueístas como o painel do impostômetro, a elite brasileira tem obtido êxito em convencer e arregimentar mais e mais incautos para incorporarem e reproduzirem, como papagaios, suas inverdades e meias-verdades. Assim procedendo, prossegue sua marcha para o aprofundamento das reformas neoliberais no Brasil e a conseqüente barbárie que dela poderá advir.