domingo, 9 de setembro de 2012

Auschwitz sem cercas

Estão livres, mas, ao mesmo tempo, estão aprisionados.
 
Estão livres, mas não para se alimentarem digna e adequamente quando estiverem com fome.
 
Estão livres, mas correm risco eminente de constarem entre as vítimas de todo tipo de violência, e de serem assassinados, pois não possuem a moeda dos incluídos para comprar, financiar ou alugar uma habitação digna na qual se sintam (e estejam de fato) protegidos.
 
Estão livres, mas não são nem serão atendidos por médicos muito bons em igualmente muito bons hospitais, pois estes são privilégios dos incluídos no sistema que exclui aos montes, e no mundo real nega o direito à vida à maioria dos que não conseguem pagar por uma assistência médica digna igual à oferecida aos mais ricos.
 
Estão livres, mas somente terão água tratada para beber e hieginizarem a si mesmos e suas residências se puderem pagar por esse serviço, e também pelo de coleta de esgotos, ambos privatizados sob o sistema neoliberal (capitalista selvagem). Se não puderem, estarão aprisionados em sua própria condição sub-humana, e serão como moradores de rua entre algumas paredes e uma cobertura.
 
Estão livres, mas não terão educação na quantidade e qualidade necessárias para uma melhor compreensão do mundo, nem para que esta os transforme em "capital humano", pois esta condição continuará sendo privilégio de poucos sob o sistema cujas características mais marcantes são a marginalização e a inutilização da maioria.
 
Estão livres, mas não para viver, pois para viver é necessário pagar, e para pagar é necessário ter renda, e para ter renda é necessário estar incluído, e para estar incluído é necessário ser parte da elite econômica, e para fazer parte desta é necessário estar e/ou ter potencialidade para estar empreendedor, cliente de alto poder aquisitivo, funcionário altamente especializado, artista ou atleta ímpar, ou ainda, capital humano dotado de qualidades ímpares para o sistema do capital.
 
Vêm a minha imaginação os rostos arrasados e os corpos esquálidos de judeus, ciganos, comunistas, socialistas, deficientes mentais, homossexuais e tantos outros, encarcerados e assassinados nos campos de extermínio nazistas, e brotam simultaneamente os rostos dos miseráveis das mais diversas cidades brasileiras (entre os quais constam os moradores e moradoras de rua), tratados com indiferença e desprezo pela maioria das pessoas que espelham o sistema neoliberal.

Esses miseráveis estão livres, mas, ao mesmo tempo, estão aprisionados.
 
Pois não há liberdade em um sistema onde os seres humanos não são livres para suprir-se do necessário para sua própria subsistência e dignidade.
 
 

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