sábado, 23 de outubro de 2010

Alienação e estupidez mental - 1

É revoltante vermos jovens, adultos e até idosos querendo arrebentar a cabeça de algum outro semelhante simplesmente porque trata-se de um torcedor de time de futebol adversário, com camisa contendo escudo diferente de seu próprio time, e por vezes cores e design diferentes. Como se não bastasse a própria estupidez da violência, em si, praticada por hordas criminosas idiotizadas e inconscientes dos verdadeiros porquês de seus dramas pessoais,  acrescenta-se a essa estupidez o motivo fútil.

O conceito de alienação foi pensado e exposto por diversos filósofos, entre os quais consta Karl Marx, que lhe deu um significado próprio relacionado ao não desfrute, por parte dos que dependem do trabalho para sobreviver, da maior parte dos bens e serviços os quais produzem, e que pertencem aos detentores do capital. Considerou isso como uma alienação da mercadoria pelo detentor do capital com relação aos que a produziram.

Marx defendia que o determinante fundamental do valor de uma mercadoria, ou mesmo de uma prestação de serviço, era a quantidade de trabalho contida em ambos e que é apropriada pelo empreendedor e investidor [1] (o detentor do capital), em contraposição, por exemplo, a Adam Smith, que considerava este valor como um conjunto de preços - digamos assim - que a compunham (salário, lucro e aluguel da terra, por exemplo) [2]

A esse significado do termo foi acrescentado o de alienação no sentido de o ser que depende do trabalho para subsistir alienar-se com relação a sua própria condição dentro do sistema capitalista, envolvido em atividades de entretenimento propositalmente ou não criadas pelos "gerentes do sistema" para este fim, ou simplesmente criadas para a geração de lucro, e que aleatoriamente funcionam como instrumentos de alienação.

Uma dessas atividades de entretenimento no Brasil é o futebol e o ato de torcer por um time com o qual o torcedor se identifica, no qual deposita sua confiança de vitória a cada adversário que enfrenta. Tal identificação muita vez se reveste de sentimento e significado inconscientes que parecem extravazar-se, como uma espécie de catarse[3], sempre que o time para o qual se torce vence ou, pelo menos, empata uma partida, expelindo, mesmo que por alguns minutos ou horas, as mais diversas frustrações e fracassos vivenciados sob um sistema de exclusão e de transformação do ser humano em um lixo ambulante não-reciclável. 

Se, no entanto, o time para o qual se torce empata e este empate é ruim para a colocação do mesmo em uma dada competição, ou, pior ainda, é derrotado, ao invés da catarse momentânea emergem sentimentos reprimidos e depositados ao longo do tempo no chamado ego inconsciente[4], os quais se manifestam através da violência de expressões, palavras ou atos dirigidos  a algum semelhante, por vezes da mesma classe social e que compartilha das mesmas frustrações (desemprego, subemprego, discriminações no mercado de trabalho, e muitas outras) causadas pelo sistema de exclusão e de extração da mais-valia dos que dependem do trabalho para sobreviver, caracterizando-se como pura alienação e estupidez mental.

Não há perspectiva de que a maior parte dos miseráveis, dos pobres e dos que estão (atente para o significado transitório deste verbo) na classe média alienados conscientizem-se de sua real condição no sistema neoliberal, e canalizem suas energias para a oposição obstinada a esse sistema, em vez de se agredirem e até se matarem por motivos fúteis.



Abaixo constam alguns links e títulos de livros que dão sustentação teórica ao pensamento exposto neste artigo, e que no texto constam como números entre colchetes e em vermelho.

O conceito de alienação 

[1] - Leia o trecho abaixo e a íntegra do texto acessando o link subsequente (copyright Klepsidra - Revista Virtual de História, texto de Carlos Ignácio Pinto).

"Portanto, um dos determinantes do valor da mercadoria é o trabalho despendido em sua fabricação. Assim sendo, o trabalho não possui a característica de ser reconhecido na compra da mercadoria, porem, no valor da mesma. O trabalho despendido desta forma, tornou-se valor agregado, passando ao aspecto de "venda" da mão de obra, sem a interligação do trabalhador e o produto, surgindo neste meio, o proprietário dos meios de produção. O trabalho tornou-se uma mercadoria, a partir do momento que o trabalhador a vende como única fonte de sua sobrevivência." 

O Trabalho em Marx 

[2] - História do Pensamento Econômico, de E. K. Hunt , editora Campus, 4ª edição 


[3] - Leia sobre o conceito de catarse acessando o link abaixo ou digitando-o em um site de busca.

O conceito de catarse


[4] - Leia sobre o conceito de ego inconsciente ou ego recalcado acessando o link abaixo ou digitando-o em um site de busca.

O conceito de ego recalcado 



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