quinta-feira, 25 de outubro de 2012

O papel das OS (organizações sociais) no sistema neoliberal


Na campanha eleitoral de 2012 para a eleição de prefeito e vereador da cidade de São Paulo, o candidato a prefeito do partido que se diz “social-democrata” manifestou bastante temor de que houvesse alguma alteração no modelo de gestão da assistência médica na referida cidade. Ele e a elite econômica que o apoia temem que haja alterações no sistema de parceria do governo municipal com as chamadas Organizações Sociais na assistência médica, ambulatorial e hospitalar do município, calcado em contratos de gestão firmados entre a prefeitura e as OSs (sigla comumente usada para Organizações Sociais) .

O provável início da implantação dos contratos de gestão entre um governo e as entidades ditas sem fins lucrativos deu-se no primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso, lá pelos idos de 1998, em algum Estado ou município governado pelo PSDB ou partido coligado, quando as ideias neoliberais estavam muito mais fortes no Brasil (hoje, elas continuam fortes, mas muito mais pela força das repressões aos movimentos que as condenam do que pelo número dos que de fato creem nelas) tendo à frente do Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado o hoje crítico do sistema neoliberal Luiz Carlos Bresser Pereira, e como secretária-executiva Cláudia Costin [1] .   

Em plena sintonia com a ideologia da transformação de grande parte dos seres humanos em lixo orgânico, putrefato e inútil, o grande objetivo de tal estratégia era (e continua sendo) precarizar, subumanizar e tornar muito mais fácil a demissão de funcionários públicos considerados sem importância para o Estado, ou seja, aqueles não vinculados a carreiras ditas típicas de Estado, a fim de diminuir a instituição no que se refere aos gastos com pessoal, mas fortalecê-la nos gastos com as diversas formas de subsídio, proteção e ampliação das atividades econômicas da elite econômica nacional e transnacional[2] .

Diferentemente dos liberais no campo econômico de diversas vertentes e dos anarcocapitalistas, os tecnocratas do PSDB e associados formularam uma estratégia um pouco diferente para tornar o Estado mínimo em setores que muito provavelmente causariam indignação na grande maioria dos usuários pobres se fossem simplesmente privatizados, optando então pelo firmamento de contratos de gestão entre o governo e as OS nas áreas de assistência média, ambulatorial e hospitalar e assistência social, entre outras. Com as OS, dar-se-ia e da-se a impressão de que o governo continua atuando no setor terceirizado para uma entidade “sem fins lucrativos”, mas no mundo real os grandes beneficiados são a elite econômica e os políticos que a representam.

Não há melhora significativa com a transferência de atividades consideradas “não típicas de Estado” para as OS, pois o montante de recursos destinados a essas atividades, os salários de muitos funcionários, a compra e manutenção de materiais e equipamentos essenciais permanecem aquém do necessário, além da instauração da mesma rotatividade de funcionários existente no setor privado e do sistema de compras da OS que não se submete ao mesmo controle existente nas licitações de órgãos públicos e estatais.

Em não havendo a mesma rigidez e controle de tais entidades públicas, não estatais e de direito privado quanto a suas compras de produtos, materiais e equipamentos, e na contratação de serviços, abre-se (talvez até se escancare) uma janela para que pessoas que façam parte da direção dessa entidade, políticos e empresários se locupletem, criando um círculo vicioso de corrupção e tentativa de perpetuação no poder das mesmas forças políticas em conluio com empresários, grupos econômicos e dirigentes dessas entidades.

A retórica da eficiência no uso dos recursos e na prestação de serviços ditos “não típicos de Estado” extinguindo ou substituindo pouco a pouco entidades públicas e estatais por entidades públicas não-estatais de direito privado “sem fins lucrativos” objetiva, em linhas simples, o que foi exposto nos parágrafos anteriores, além de contribuir significativamente para que a elite econômica nacional e transnacional apropire-se ou reaproprie-se de grande parte da renda e da riqueza distribuída para setores da classe média baixa e dos mais pobres que constituem os servidores públicos de entidades públicas e estatais agora submetidos à condição de servidores demissíveis sem justa causa, e a própria população de baixa renda que se vê obrigada a recorrer aos sistemas públicos de assistência médica, ambulatorial, hospitalar, social e outras sem melhorias significativas quando prestadas pelas tais Organizações Sociais (OS).



 
[1] Leia o texto logo abaixo, intitulado "Organizações Sociais - Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado - 1998", em formato de pdf, publicado pelo referido ministério e no qual havia a firme determinação de transferir para as chamadas Organizações Sociais (OS) grande parte (ou todos os serviços) dos serviços tidos como atividades não essenciais do Estado.



[2] Aqui se encaixam desde as diversas formas de renúncia na cobrança de tributos, ou de redução de tributos, por parte do Estado, de certos setores econômicos (das áreas industrial, comercial, financeira, de serviços e outras) que, segundo os governos adeptos de tal ideologia, contribuam para o aumento dos investimentos e geram empregos diretos e indiretos - pouco importando se se trata de empregos precários ou até de condição subumana -, até mais investimentos do Estado nos setores de infraestrutura (rodovias, ferrovias, portos, aeroportos, hidrelétricas, termoelétricas, e outros) ou concessão de tais setores por longos anos à iniciativa privada mediante contrato favorável a esta última e, por vezes, empréstimos subsiados que lhe sejam feitos por algum banco de fomento estatal (em casos recentes do Brasil, o BNDES).

 

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